domingo, 5 de setembro de 2010

PARTIR... CAMINHAR...


Partir é, antes e tudo, sair de si. Romper a crosta de egoísmo
que tende aprisionar-nos no próprio eu.

Partir é não rodar, permanentemente, em torno de si,
numa atitude de quem, na prática,
se constitui centro do Mundo e da vida.

Partir é não rodar apenas em volta dos problemas
das instituições a que pertence. Por mais importantes que elas sejam,
maior é a humanidade a quem nos cabe servir.

Partir, mais do que devorar estradas, cruzar mares ou atingir
velocidades supersônicas, é abrir-se aos outros,
descobri-los, ir-lhes ao encontro.

Abrir-se às idéias, inclusive contrárias às próprias,
demonstra fôlego de bom caminheiro.

Feliz de quem entende e vive este pensamento:
" Se discordas de mim, tu me enriqueces".

Ter ao próprio lado quem só sabe dizer amém,
quem concorda sempre, de antemão e incondicionalmente,
não é ter um companheiro, mas sim uma sombra de si mesmo.

Desde que a discordância não seja sistemática e proposital,
que seja fruto de visão diferente, a partir de ângulos novos,
importa de fato em enriquecimento.

É possível caminhar sozinho. Mas o bom viajante sabe que
a grande caminhada é a vida e esta supõe companheiros.
Companheiro, etimologicamente, é quem come o mesmo pão.

O bom caminheiro preocupa-se com os companheiros
desencorajados, sem ânimo, sem esperança...

Advinha o instante em que se acham a um palmo do desespero.

Apanha-os onde se encontram. Deixa que desabafem e,
com inteligência, com habilidade, sobretudo, com amor,
leva-os a recobrar o ânimo e volta a ter gosto na caminhada.

Marchar por marchar não é ainda verdadeiramente caminhar.

Para as minorias Abraâmicas, partir, caminhar significa mover-se
e ajudar muitos outros a moverem-se no sentido de tudo fazer
por um mundo mais justo e mais humano.

D. Helder Câmara(1909-1999)