domingo, 28 de fevereiro de 2021

O TEMPO DAS COISAS


"Poderíamos, com mais frequência, tentar deixar a vida em paz para desembrulhar suas flores no tempo dela, no tempo delas, e, em alguns momentos, nem desembrulhar. Apesar da nossa cuidadosa aposta nas sementes, algumas simplesmente não vingam e isso não significa que a vida, por algum motivo, está se vingando de nós. Há muito mais jardim para ser desembrulhado.


Poderíamos, mais vezes, tentar respeitar os dias e as noites das coisas, os sóis e as luas de cada uma, os amanheceres, os entardeceres, as madrugadas, a sabedoria reparadora e tecelã dos intervalos, as estações todas com seus jeitos todos de dizer. Percebermos, mais vezes, a partir da nossa própria experiência humana, que tudo o que vive, queira ou não, está submetido à inteligência natural e engenhosa das fases. Dos ciclos. Da permanente impermanência. Da mudança.


Poderíamos, amiúde, tentar desviar nossa atenção do relógio perigoso da expectativa, geralmente adiantado demais. Aquele tal cuja velocidade transtornada dos ponteiros costuma apontar para o tamanho e a urgência das nossas carências. Para a necessidade de preenchimento imediato e contínuo do que chamamos de vazio, às vezes porque é, às vezes por falta de palavra melhor. Aquele tal relógio que geralmente só antecipa frustração e atrasa sossego. Aquele tal que costuma só fomentar dificuldades e alimentar fomes.


Mas, não. A crisálida ainda está se acostumando com a ideia de ser borboleta e já queremos que voe. A flor ainda é botão e, em vez de apreciá-la como botão, ficamos apressados para vê-la desabrochada. O fruto ainda precisa amadurecer, mas o arrancamos, verde, do pé, por mera ansiedade. Ainda é a vez do tempo estar vestido de noite, mas queremos que se troque rapidinho para vestir-se de manhã.


Nossa impaciência, nossa pressa ávida pelo resultado das coisas do jeito que queremos, no tempo que queremos, geralmente altera o sábio fluxo do tempo da vida e o desdobramento costuma não ser lá muito agradável. Não é raro, nós o atribuímos à má sorte, ao carma, ao mau-olhado. Não é raro, culpamos Deus, os outros, os astros, os antepassados. Não é raro, é claro, nós ainda nos achamos cobertos de razão.


É fácil lidar com isso? Não é não. Nem um pouco. Esse é um dos capítulos mais difíceis do livro-texto e do caderno de exercícios: o aprendizado do respeito ao sábio tempo das coisas."

(Ana Jácomo)

UM DIA VOCÊ APRENDE...

 


Depois de algum tempo você aprende a diferença, a sutil diferença, entre dar a mão e acorrentar a alma. Aprende que não significa apoiar-se, e que companhia nem sempre significa segurança.

E começa a aprender que beijos não são contratos; e presentes não são promessas. Começa a aceitar suas derrotas com cabeça erguida e olhos adiante, com a graça de um adulto e não com a tristeza de uma criança.

Depois de um tempo, aprende que o sol queima se você ficar exposto por muito tempo. E aprende que não importa o quanto você se importe, algumas pessoas simplesmente não se importam... E aceita que não importa quão boa seja uma pessoa, ela vai feri-lo de vez em quando e você precisa perdoá-la por isso.

Aprende que falar pode aliviar dores emocionais. E aprende a construir todas as suas estradas no hoje, porque o terreno do amanhã é incerto demais para os planos, e o futuro tem o costume de cair em meio ao vão.

Descobre que se levam anos para construir confiança e apenas segundos para destruí-la. Que você pode fazer coisas em um instante, das quais se arrependerá pelo resto da vida.

Aprende que verdadeiras amizades continuam a crescer, mesmo à longa distância. E o que importa não é o que você tem na vida, mas quem você tem na vida. E que bons amigos são a família que nos permitem escolher.

Aprende que não temos que mudar de amigos, se compreendermos que os amigos mudam... Aprende a perceber que seu melhor amigo e você podem fazer qualquer coisa, ou nada, e terem bons momentos juntos.

Descobre que as pessoas com quem você mais se importa na vida são tomadas de você muito depressa, por isso, sempre devemos tratar as pessoas que amamos com palavras amorosas. Pode ser a última vez que as vejamos.

Aprende que as circunstâncias e os ambientes têm influência sobre nós, mas... Nós somos responsáveis por nós mesmos.

Começa a aprender que não se deve comparar com os outros, mas com o melhor que se pode ser. Descobre que se leva muito tempo para se tornar a pessoa que quer ser, e que o tempo é curto.

Aprende que não importa aonde já chegou, mas para onde está indo. Mas, se você não sabe para onde está indo, qualquer lugar serve.

Com o tempo você aprende que, ou você controla seus atos ou, eles, o controlarão. E que ser flexível não significa ser fraco ou não ter personalidade, pois não importa quão delicada e frágil seja uma situação. Sempre existem dois lados.

Aprende que heróis são pessoas que fizeram o que era necessário fazer, enfrentando as consequências. Aprende que paciência requer muita prática. Descobre que algumas vezes as pessoas que você espera que o chutem, quando você cai, são as poucas que o ajudam a levantar-se.

Aprende que maturidade tem mais a ver com os tipos de experiência que se teve e o que você aprendeu com elas, do que com quantos aniversários você já celebrou.

Aprende que há mais dos seus pais em você do que você supõe. Aprende que nunca se deve dizer a uma criança que sonhos são bobagens. Poucas coisas são tão humilhantes, e seria uma tragédia se ela acreditasse nisso. Aprende que, quando está com raiva, tem o direito de estar com raiva, mas isso não lhe dá o direito de ser cruel.

Descobre que, só porque alguém não o ama do jeito que você quer que ame, não significa que esse alguém não o ama com tudo que pode. Existem pessoas que nos amam, mas simplesmente não sabem como demonstrar ou viver isso.

Aprende que nem sempre é suficiente ser perdoado por alguém. Algumas vezes, você tem que aprender a perdoar a si mesmo. Aprende que, com a mesma severidade com que julga, você será um dia condenado.

Aprende que não importa em quantos pedaços o seu coração foi partido. O mundo não para para que você o conserte. Aprende que o tempo não é algo que possa voltar atrás; portanto, plante seu jardim e decore a sua alma, ao invés de esperar que alguém lhe traga flores.

E você aprende que realmente pode suportar. Que realmente é forte e que pode ir muito mais longe, depois de pensar que não pode mais.

 E que, realmente, a vida tem valor, que você tem valor diante da vida! Nossas dádivas são traidoras e nos fazem perder o bem que poderíamos conquistar, se não fosse o medo de tentar”.

Que esta mensagem, de autoria de William Shakespeare, seja um elemento a mais para colaborar na reflexão sobre as perdas e conquistas que você acumulou e, também, que suas esperanças sejam renovadas para uma vida com um sentido cada vez mais real, repleta dos melhores acontecimentos que ela possa oferecer!


segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

RECIPROCIDADE E SINTONIA

     

     Fala-se que o amor é algo lindo, que deve ser sentido plenamente e que ninguém fica com ninguém se não houver vontade e desejo. Concordo. Deve haver sintonia para que a relação flua como ela realmente deve ser, que deve vir junto com a reciprocidade. Se ambas não existirem... não rola nada.

A falta de reciprocidade é quando uma pessoa tenta se aproximar de outra e quando chega a vez desta fazer o mesmo... não está nem aí, sai pela tangente. Sintonia? Nem pensar. Se tentativas de proximidade, repetidas vezes, acontecem, é sinal de que não tem os mesmos interesses, não está a fim, talvez nem serem amigos. É ou não é? Mas brincar com os sentimentos do outro, não é legal.

Agora, há uma receita certa para amar? Claro que não. O que eu sei, você sabe... nós sabemos é que duas pessoas devem estar envolvidas por igual. Creio ser esta a “receita”

Lá vai uma frase pra reflexão: "Todo mundo diz que o amor dói, mas não é verdade. Solidão dói. A rejeição dói. Perder alguém dói. Todo mundo confunde essas coisas com amor, mas na verdade, o amor é a única coisa neste mundo que cobre toda a dor e nos faz sentir maravilhosos."(Oscar Wilde). Amar por amar... isso acontece. Fazer o que, quando se esforça e os sentimentos não são correspondidos? É claro que desejamos que tudo seja sempre mútuo e recíproco, mas infelizmente nem sempre isso é possível.

Motivos para desanimar ou mesmo para mudar de atitudes? Não mesmo. Querem saber de uma coisa?  O que importa é que, acima de tudo, sejamos fieis aos nossos sentimentos. Pronto!

Quem ‘perde” é quem não recebe o amor. Talvez tenha “medo” de se entregar, de amar, quem sabe não foi ainda tocado pelo verdadeiro amor, ou, simplesmente, queira ser só amado.

Nair Pimenta

sábado, 24 de outubro de 2020

REENCONTRO

 

Eu vim aqui me buscar. E aqui parecia ser longe, muito longe do lugar onde eu estava, o medo costuma ver as distâncias com lente de aumento.

Vim aqui me buscar porque a insatisfação me perguntava incontáveis vezes o que eu iria fazer para transformá-la e chegou um momento em que eu não consegui mais lhe dizer simplesmente que eu não sabia.

Vim aqui me buscar porque cansei de fazer de conta que eu não tinha nenhuma responsabilidade com relação ao padrão repetitivo da maioria das circunstâncias difíceis que eu vivenciava.

Vim aqui me buscar porque a vida se tornou tediosa demais. Opaca demais. Cansativa demais. Encolhida.

Vim aqui me buscar porque, para onde quer que eu olhasse, eu não me encontrava. Porque sentia uma saudade tão grande que chegava a doer e, embora persistisse em acreditar que ela reclamava de outras ausências, a verdade é que o tempo inteirinho ela falava da minha falta de mim.

Vim aqui me buscar porque percebi que estava muito distante e que a prioridade era eu me trazer de volta. Isso, se quisesse experimentar contentamento. Se quisesse criar espaço, depois de tanto aperto. Se quisesse sentir o conforto bom da leveza, depois de tanto peso suportado. Se quisesse crescer no amor.

Vim aqui me buscar, com medo e coragem. Com toda a entrega que me era possível. Com a humildade de quem descobre se conhecer menos do que supunha e com o claro propósito de se conhecer mais.

Vim aqui me buscar para varrer entulhos. Passar a limpo alguns rascunhos. Resgatar o viço do olhar. Trocar de bem com a vida. Rir com Deus, outra vez.

Vim aqui me buscar para não me contentar com a mesmice. Para dizer minhas flores. Para não me surpreender ao me flagrar feliz. Para ser parecida comigo. Para me sentir em casa, de novo.

Vim aqui me buscar. Aqui, no meu coração.

(Ana Jácomo)

sexta-feira, 4 de setembro de 2020

DÊ VOZ



“Engole o choro. Engole sapo. Cala a boca. Cala o peito. Mas o corpo fala, e como fala. Fala a ponta dos dedos batendo na mesa. Falam os pés inquietos na cama. Fala a dor de cabeça. Fala a gastrite, o refluxo, a ansiedade. Fala o nó na garganta atravessado. Fala a angústia, fala a ruga na testa. Fala a insônia, o sono demasiado.
Você se cala, mas o falatório interno começa. As pessoas adoecem porque cultivam e guardam as coisas não digeridas dentro de seus corações. O normal do ser humano seria a comunicação e conseguir dizer o que está sentindo. Mas nem todos se habilitam para esse difícil exercício. Nem sempre digerimos bem aquelas pequenas coisas, como mensagens mal respondidas, as palavras que machucam...
Você finge que não ouviu, engole e tudo isso vai se acumulando até que um dia enche. Esses pequenos fatos indigestos percorrem a garganta, entram no estômago, invadem o peito, e se deixarmos, calará nossa boca e nossa paz. O importante é não deixar acumular ou achar que simplesmente vai aliviar com o passar dos dias. O tempo até tem um papel importante, mas não resolve tudo.
Tentar mostrar que tudo sempre está bem requer muita energia, o desgaste emocional é grande. Não dá pra engolir tudo e dizer amém! Eu sei. Também não dá pra cometer sincericídios por aí e sair vomitando as coisas entaladas na sua garganta. Mas dá para se expressar.
Tem hora que o sentimento pede pra ser dito, entendido, descodificado, traduzido. Tudo que ele quer é ser exorcizado pela palavra ou pela via que lhe cabe melhor. Expressar tranquiliza a dor. Dor não é pra sentir pra sempre. Dor é vírgula.
Então faz uma carta, um poema, um livro. Canta uma música. Pega as sapatilhas, sapateia. Faz uma aquarela. Faz uma vida. Faz piada, faz texto, faz quadro, faz encontro com amigos. Faz corrida no parque. Fala pro seu analista, fala para Deus, para o universo... se pinta de artista. Conversa sozinho, papeia com seu cachorro, solta um grito pro céu, mas não se cale.
Pois “se você engolir tudo que sente, no final você se afoga”."
Ruth Borges (Revista Bula)

TEMPO TEMPO



Aproveitar o tempo... É isso aí. Porque o Tempo é a própria Vida.

O que precisamos para viver bem? É saber usá-lo, não na correria, não o desperdiçando, mas dando sentido a ele. Nele, construímos nossas vidas
Cada instante, cada momento de nossa existência tem desdobramentos, desafios, consequências, que influenciam nossa caminhada por aqui e lá na eternidade, não é mesmo? E é por aí que se vive. Não sou muito de “matar o tempo”, porque deixo de viver. E eu quero viver bem, segundo Ele.
Sabe? O Tempo/Vida nos dá oportunidades e, da melhor maneira possível, devemos agarrá-las, abraçá-las, para crescer, para não ficarmos estagnados. E o amor... nos ajuda, nos impulsiona, nos faz crescer, dá um sentido maior ao Tempo/Vida.
Não jogo fora meu tempo não, ele tem limites aqui na terra. Não é mesmo?
Bem... pelo prisma da fé, da espiritualidade, o Tempo de Deus é diferente do nosso, mas este – o nosso - ganha sentido maior se acolhermos o d’Ele.
(Nair Pimenta)

terça-feira, 11 de agosto de 2020

“VIVER É UM RASGAR-SE E REMENDAR-SE”


   Meus joelhos trazem marcas de uma infância bem vivida. Há o tombo da bicicleta na ladeira da igreja, o escorregão no barranco atrás da casa da vó, a queda brusca na travessia da rua de paralelepípedos do trabalho do pai.

Olho para minhas cicatrizes e me lembro da dor que ficou lá atrás, junto com as histórias que desconstruí e voltei a escrever com uma caligrafia mais amadurecida.

Tenho descoberto que, assim como Guimarães Rosa poetizou, “Viver é um rasgar-se e remendar-se”. 

Talvez ele já soubesse que a vida é feita de desconstruções e reconstruções, e que, ainda que nossas bainhas desfeitas nos causem tanta dor, outros arranjos serão possíveis no seu tempo, mostrando que jamais seremos os mesmos, mas isso também significa crescer.

Estar “remendado” pela vida não nos torna mais tristes ou piores. Ao contrário, estar remendado quer dizer que evoluímos, que conseguimos lidar com nossos abismos e nos reerguemos, que ralamos a alma no chão de nossas aflições e nos tornamos mais fortes e corajosos.

Algumas cicatrizes são imperceptíveis aos olhos, mas nem por isso doem menos. Porém, também trazem o tempo do amadurecimento, tempo em que a inconstância e a agitação da imaturidade dão lugar ao silêncio e à serenidade da calmaria.

Viver é dar novo sentido ao que vamos nos tornando com o passar do tempo. Pois o que somos hoje não é o mesmo que ontem, e nem será o mesmo que amanhã. Nos descosturamos e remendamos incessantemente, fazendo novas escolhas, renunciando ao que não serve mais, viajando para um lugar diferente, assistindo a algum filme ou documentário interessante, lendo algum texto num livro antigo ou na internet, batendo papo com aquele amigo inteligente, experimentando um novo sabor, ouvindo uma boa música.

Crescemos, nos despedimos, nos vestimos e nos despimos. É preciso ser feliz com aquilo que nos pertence, com a colcha de retalhos que nos tornamos, com as pontas descosturadas e as novas emendas que compõem nosso tecido.

A gente muda e nosso mundo se transforma. É preciso reaprender a lidar com o que nos tornamos depois que somos descosturados. É preciso encontrar sentido nas novas realidades que agora fazem parte do nosso mundo e de nós mesmos. Aprender a conviver com a falta, com o silêncio, mas também com a chegada de novas alegrias e surpresas.

Ainda me lembro dos tombos memoráveis da minha infância. Foram eles que me ensinaram a me resguardar do perigo e andar mais cuidadosa pela vida. Me rasgaram a pele, sangraram e causaram dor. Hoje são só sinais de um tempo bom que não existe mais. Cresci, acumulei conhecimento e alguma serenidade, e hoje tento passar ao meu filho um vestígio da minha experiência. Porém, sei que antes ele precisará rasgar-se e descosturar-se para então reconhecer seu espaço e seu caminho.

Ninguém pode nos poupar do que está reservado para nós. As pedras, desafios e alegrias de nosso caminho são só nossos, e os remendos adquiridos no decorrer do tempo, também…

(Fabíola Simões)